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Foi mais poderosa aquela que mais amou

Posted by Luiz Fernando Vieira

     Escolástica, irmã de São Bento, consagrada ao Senhor onipotente desde a infância, costumava visitar o irmão, uma vez por ano. O homem de Deus descia e vinha encontrar-se com ela numa propriedade do mosteiro, não muito longe da porta. Certo dia, veio ela como de costume, e seu venerável irmão com alguns discípulos foi ao seu encontro. Passaram o dia inteiro a louvar a Deus e em santas conversas, de tal modo que já se aproximavam as trevas da noite quando sentaram-se à mesa para tomar a refeição. Como durante as santas conversas o tempo foi passando, a santa monja rogou-lhe: “Peço-te, irmão, que não me deixes esta noite, para podermos continuar falando até de manhã sobre as alegrias da vida celeste”. Ao que ele respondeu-lhe:“Que dizes tu, irmã? De modo algum posso passar a noite fora da minha cela”.
      A santa monja, ao ouvira recusa do irmão, pôs sobre a mesa as mãos com os dedos entrelaçados e inclinou a cabeça sobre as mãos para suplicar o Senhor onipotente. Quando levantou a cabeça, rebentou uma grande tempestade, com tão fortes relâmpagos, trovões e aguaceiro, que nem o venerável Bento nem os irmãos que haviam vindo em sua companhia puderam pôr um pé fora da porta do lugar onde estavam.
      Então o homem de Deus, vendo que não podia regressar ao mosteiro, começou a lamentar-se,dizendo: “Que Deus onipotente te perdoe, irmã! Que foi que fizeste?” Ela respondeu: “Eu te pedi e não quiseste me atender. Roguei ao meu Deus e ele me ouviu. Agora, pois, se puderes, vai-te embora; despede-te de mim e volta para o mosteiro”. E Bento, que não quisera ficar ali espontaneamente, teve que ficar contra a vontade. Assim, passaram a noite toda acordados, animando-se um ao outro com santas conversas sobre a vida espiritual. Não nos admiremos que a santa monja tenha tido mais poder do que ele: se, na verdade, como diz São João, Deus é amor (1Jo 4,8), com justíssima razão, teve mais poder aquela que mais amou. Três dias depois, estando o homem de Deus na cela, levantou os olhos para o alto e viu a alma de sua irmã liberta do corpo, em forma de pomba, penetrar no interior da morada
celeste. Cheio de júbilo por tão grande glória que lhe havia sido concedida, deu graças a
Deus onipotente com hinos e cânticos de louvor; enviou dois irmãos a fim de trazerem o
corpo para o mosteiro, onde foi depositado no túmulo que ele mesmo preparara para si.
E assim, nem o túmulo separou aqueles que sempre tinham estado unidos em Deus.
                                       Diálogos de São Gregório Magno, papa
(Lib. 2,33: PL 66,194-196)
(Séc.VI)
 

Modelo de Castidade

Posted by Luiz Fernando Vieira

A comemoração do aniversário de Santa Águeda nos reúne a todos neste lugar, como se
fôssemos um só. Bem conheceis, meus ouvintes, o combate glorioso desta mártir, uma
das mais antigas e ao mesmo tempo tão recente que parece estar agora mesmo lutando e vencendo, através dos divinos milagres com os quais diariamente é coroada e ornada.
A virgem Águeda nasceu do Verbo de Deus imortal e seu único Filho, que também
padeceu a morte por nós. Com efeito, João, o teólogo, assim se exprime: A todos
aqueles que o receberam, deu-lhes a capacidade de se tornarem filhos de Deus (Jo
1,12).
É uma virgem esta mulher que nos convidou para o sagrado banquete; é a mulher
desposada com um único esposo, Cristo, para usar as mesmas expressões do apóstolo
Paulo, ao falar da união conjugal.
É uma virgem que pintava e enfeitava os olhos e os lábios com a luz da consciência e a
cor do sangue do verdadeiro e divino Cordeiro; e que, pela meditação contínua, trazia
sempre em seu íntimo a morte daquele que tanto amava. Deste modo, a mística veste de
seu testemunho fala por si mesma a todas as gerações futuras, porque traz em si a marca indelével do sangue de Cristo e o tesouro inesgotável da sua eloqüência virginal.
Ela é uma imagem autêntica da bondade, porque, sendo de Deus, vem da parte de seu
Esposo nos tornar participantes daqueles bens, dos quais seu nome traz o valor e o
significado: Águeda (que quer dizer “boa”) é um dom que nos foi concedido por Deus,
verdadeira fonte de bondade.
Qual a causa suprema de toda a bondade, senão aquela que é o Sumo Bem? Por isso,
quem encontrará algo mais que mereça, como Águeda, os nossos elogios e louvores?
Águeda, cuja bondade corresponde tão bem ao nome e à realidade! Águeda, que pelos
feitos notáveis traz consigo um nome glorioso, e no próprio nome demonstra as ilustres
ações que realizou! Águeda, que nos atrai com o nome, para que todos venham ao seu
encontro, e com o exemplo nos ensina a corrermos sem demora para o verdadeiro bem,
que é Deus somente!
 
Sermão na festa de Santa Águeda, de São Metódio da Sicília, bispo